o paraíso é para todos

das perguntas sem resposta, acho que a que me faço com mais frequência é onde é que eu estava? hoje cedo na receita federal eu fui a terceira pessoa a chegar. peguei minha senha, pfn3, procurei uma cadeira e sentei. olhei pela janela pelo que pensei serem apenas alguns segundos, tentando adivinhar como seria o resto do dia. quente? teria sombra? minha água estava esquentando no carro? e então a tv avisou: pfn5. eu não vi aquelas pessoas entrarem, eu não ouvi a tv me chamar repetidas vezes, onde é que eu estava? onde é que eu estava? assim mesmo deve ter sido no dia em que todas as pessoas ao meu redor foram chamadas pra receber a pílula do esquecimento e eu perdi minha vez. não fui vacinada contra o mal do século e agora tô aqui sozinha. e me sentindo sozinha, o que é bem pior. não desaprendi a amar o próximo, não desaprendi de me apaixonar por um sorriso que chega até mim, pelo abraço que me aperta quando eu preciso – mesmo que eu não saiba disso -, pela coragem de admitir um erro, uma opinião, um sentimento honesto qualquer.

e vieram os últimos dias… quando eu percebi que não só desaprenderam a amar como também esqueceram o que é o amor. quando o amor se tornou uno e restrito (a restrição do amor me dói). quando foi que o amor se tornou uma coisa tão rara que adquiriu valor de preciosidade? quando o amor passou a ser privilégio de uma única pessoa, não podendo ser dado a uma pessoa bonita, a um dia feliz, ao som dos passarinhos na janela,  a um macaco que vê a luz do sol pela primeira vez em anos? eu não acho que o amor seja uma jóia ou algo a ser preservado. acho que ele é auto suficiente e inesgotável mas tá minguando dentro da gente, porque a gente não tá mais usando ele. porque a gente não pode mais usar ele. amor virou sinônimo de fraqueza, e eu simplesmente não entendo onde diabos eu estava quando isso aconteceu. chegou esse tempo em que se luta contra a banalização do amor, como se ele tivesse que ser guardado pra alguém especial, desprezando todas as coisas especiais e todas as pessoas com alguma coisa especial que tão por aí também, às vezes sem nem saber o que é que elas têm guardado tanto. a gente tem guardado amor por tanto tempo e tão escondido que já nem sabe mais como é e onde fica. como é que esperamos reconhecê-lo e tê-lo reconhecido em nós um dia?

foi quando eu me peguei pensando no que eu escolheria caso ganhasse a oportunidade de proferir uma única frase e ela fosse sussurrada no ouvido dos sete bilhões de pessoas ao redor do globo enquanto dormem, mas tão profundamente que as fizesse pensar nisso pelo resto do dia. meu primeiro impulso foi de escolher uma coisa tão simples que pudesse ter vários significados e fosse facilmente digerida, tipo “que merda é essa?”. mas acho que tá mais fácil achar filhote de pombo do que responder essa pergunta. e então todas as pastas dos meus arquivos mentais foram sendo abertas e consultadas, uma a uma até que eu chegasse naquele ponto de indecisão que a gente desiste e deixa pra lá. e aí aquela pintura no muro sussurrou no meu ouvido enquanto eu dormia, mas tão profundamente que me fez pensar nela pelo resto do dia: mais amor por favor.

One thought on “o paraíso é para todos

  1. “eu não acho que o amor seja uma jóia ou algo a ser preservado. acho que ele é auto suficiente e inesgotável mas tá minguando dentro da gente, porque a gente não tá mais usando ele.”

    Choray. Se eu pudesse dizer algo agora, seria que amo esse texto, e que amo a sua forma de escrever e que amo que você e a paten e todas as MQNSP tenham cruzado o caminho comigo na vida. Lindo demais o seu texto. ;)

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